Diversidade

Mês das mulheres: precisamos falar sobre violência de gênero

A prevenção da violência de gênero exige o enfrentamento das desigualdades econômicas e sociais sistêmicas, garantindo o acesso à educação e ao trabalho seguro para todas mulheres e seus marcadores sociais 

Março chegou! Com ele, surgem as homenagens pelo Mês das Mulheres, celebrado principalmente no dia 08. Elas ganham rosas no trabalho e em casa, além de receberem mensagens bonitas falando o quanto são importantes e especiais na vida das pessoas.

Mas, nas empresas e na sociedade, o que tem sido feito para as mulheres conquistarem seus espaços com igualdade e respeito?

A violência de gênero é um problema sistêmico que precisa ser efetivamente enfrentado, dentro e fora das empresas.

Nesse período em que a temática da mulher ganha muitos espaços, é importante trazer discussões e ações que vão fazer a diferença. É o que destaca Sônia Lesse, especialista em Diversidade e Inclusão e diretora de experiências na Profissas – Escola da Diversidade

Muitas empresas, por exemplo, maquiam a data com flores, bombons, fotos pras redes sociais, entre outras atividades superficiais no trabalho. É uma boa iniciativa? Sim! Mas o respeito pela mulher e os programas de valorização devem ser constantes, por meio de um desenvolvimento estruturado. Não podemos deixar o assunto morrer em março! É necessário, todos os meses, rediscutir o papel da mulher na sociedade em um esforço para tentar diminuir e, quem sabe um dia, terminar com o preconceito e a sua desvalorização”. 

Sônia enfatiza a importância de incluir, por exemplo, discussões nas empresas e em outros espaços sociais sobre as violências que as mulheres sofrem diariamente, e que infelizmente passam despercebidas pela maioria das pessoas.

Em grande parte dos casos,  as violências são as maiores barreiras na vida das mulheres, resultando em danos psicológicos, emocionais, financeiros, entre outros.

“São diversos tipos de violência que acontecem sistematicamente no Brasil e no mundo por questões de gênero. São atos que se tornam ainda mais intensos quando são mulheres que não atendem ao imaginário social sobre performar a feminilidade desejada e aceita, como mulheres transexuais, travestis, negras e com deficiências, por exemplo. Independente do tipo de agressão cometida, os direitos humanos da mulher e sua integridade física, psicológica e moral são desrespeitados todos os dias”.

De acordo com Sônia, é preciso se atentar principalmente para as violências sofridas por mulheres de outras interseccionalidades. O termo “interseccionalidade” possui o objetivo de avaliar como os sistemas de opressão têm impactos diferentes em diferentes indivíduos.

“Precisamos lembrar que as pessoas são diferentes em suas características como gênero, cor da pele, idade, classe social, localização geográfica, entre outras. Infelizmente, muitas mulheres, apenas por terem  esses marcadores da diferença, são submetidas a uma série de discriminações, preconceitos e opressões”, explica. 

Na visão de Sônia, “é preciso que empresas, governos e outras instituições e lideranças ampliem e criem mais iniciativas que visem o acolhimento e aperfeiçoamento das políticas públicas de proteção às mulheres vítimas de violência. É um trabalho que precisa ser desenvolvido para pensar sobre ações de segurança social, na perspectiva de criação de políticas sociais. O objetivo é reduzir vulnerabilidades e prevenir situações de violência contra mulheres, incluindo grupos da comunidade negra, LGBTQIAPN+, crianças, adolescentes, gestantes, PcD, 50+”, exemplifica. 

As agressões presentes nas empresas e demais espaços sociais

A violência pode ser uma realidade distante para algumas pessoas, mas ela está presente de várias formas e, muitas vezes, silenciosamente. Há violências, por exemplo, que nem sempre são vistas como tal, como é o caso das microagressões.

Elas podem ser explícitas ou implícitas.

A primeira diz respeito aos ataques diretos, palavras ou atos cujo objetivo é fazer a mulher sentir-se mal. A segunda se refere às violências camufladas, já que quem comete não possui a intenção de magoar. 

São consideradas um pouco diferentes de atos ou comentários abertamente discriminatórios. As microagressões são situações que reforçam desprezo, depreciações e insultos diários  contra as mulheres e outros grupos representativos, em diferentes contextos sociais.  

Frases como “você está de TPM”, “mulher precisa se dar ao respeito”, “até que você é uma negra bonita” e “ você é uma gorda com o rosto bonito” são muito comuns no dia-a-dia delas. Essas expressões representam preconceitos e estereótipos que a sociedade carrega, que ofendem as mulheres ao nosso redor, ainda que pareçam frases ou comentários normais.

“Precisamos ter atenção a essas violências, inclusive no ambiente corporativo. Muitas vezes elas ocorrem de maneira inconsciente, mas não é por isso que deixam de ser prejudiciais e ofensivas. O que pode soar como uma frase simples e bem-intencionada pode, ao mesmo tempo, estar carregada de estereótipos e até mesmo de vieses inconscientes”, destaca Lesse.

Nas organizações, o setor de RH e as lideranças devem ficar atentos às situações de microagressões, pois são mais comuns do que imaginamos.  As empresas precisam ser um ambiente de acolhimento para todas as pessoas, mas nem sempre é o que acontece.

A gerente de produto Luanna Teofillo, por exemplo, foi vítima de racismo em uma de suas experiências profissionais. Em 2016, Luanna  estava em seu período de experiência como business developer em uma empresa de comunicação corporativa.

O ambiente de trabalho era permissivo com piadas e comentários racistas, até que culminou com a discriminação por parte da liderança quando a funcionária trançou seus cabelos.

Diante de toda equipe, a líder da empresa exigiu que a funcionária tirasse as tranças pois, segundo ela, não aguentava mais. Disse três vezes para tirar “isso”. De lá pra cá, a empresária e gerente de produto  vem sofrendo uma perseguição jurídica por ter denunciado o racismo sofrido em seu ambiente de trabalho, além de ser impedida de divulgar seu caso na mídia. 

Só recentemente conseguiu, após diversas sentenças positivas, o direito de se expressar e denunciar o fato ocorrido, através de uma denúncia ao Conselho da Comunidade Negra e Indígena.

O que aconteceu com Luanna é o que chamamos de Lawfare

O termo americano Laware vem ganhando espaço nas mídias brasileiras. O conceito significa a utilização da lei e de procedimentos legais para perseguir desafetos e encobrir comportamentos nocivos e criminosos.

Dessa forma, o sistema judiciário é utilizado para dar aparência de legalidade à perseguição de inimigos declarados. Luanna conta que muitas pessoas vêm até ela e perguntam se vale a pena entrar na justiça contra uma empresa.

“Tudo que eu passei me faz acreditar que sim, vale a pena lutar pelos nossos direitos.  Eu entendo também quem não se expressa, pois o mundo não é lugar fácil para as pessoas pretas e outros grupos sub representados. Sofremos muitas repressões e somos julgados simplesmente por sermos quem somos. Quem denuncia também pode sofrer violências e, por isso, muitas vezes passamos por cima de uma situação e seguimos em frente, mesmo com dor e indignação”. 

Ela fala sobre a sua vontade: “o meu desejo é deixar um legado para que outras pessoas consigam garantir seus direitos. Por mais difícil que seja, abrir lugar para contar minha história e de outras pessoas que passaram ou passam pela mesma situação demonstra que temos uma missão de conquistar espaços mais respeitosos e igualitários para todos os indivíduos. Eu escolhi contar, pois o racismo não deve ser poupado: ele é  mais do que um crime, é coisa abominável que precisa acabar agora mesmo, antes que ele acabe com a vida de muitas pessoas”. 

Desigualdade de gênero no mercado de trabalho 

De acordo com dados de 2021 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) , a ampliação de políticas sociais ao longo da história do Brasil, vem melhorando as condições de vida da população em geral, fomentando a melhora de alguns indicadores para as mulheres, como nas áreas de saúde e educação.

Entretanto, essas ações ainda não são suficientes para colocá-las em situação de igualdade com homens, por exemplo,  no mercado de trabalho e em outros espaços de tomada de decisão ou liderança.

Entre os desafios que mulheres entre 25 e 49 anos enfrentam, conforme indica o estudo do IBGE, está a presença de crianças de até 3 anos de idade vivendo no domicílio. A ocupação no mercado de trabalho para as mulheres que possuem filhos nessa faixa etária é de 54,6%, abaixo dos 67,2% daquelas que não têm. 

Para homens, a realidade é oposta. Aqueles que vivem com crianças de até 3 anos de idade registraram ocupação de trabalho de 89,2%, superior aos 83,4% dos que não possuem filhos nessa faixa etária.

Na mesma condição citada anteriormente, a pesquisa mostra dificuldades maiores para mulheres pretas ou pardas. Elas apresentaram níveis de ocupação no mercado de trabalho inferiores a 50%. Para mulheres brancas, o percentual registrado é 62,3%.

“Essa menor participação no mercado de trabalho, principalmente em decorrência da maternidade, ocorre por causa uma visão perpetuada há anos de que a mulher deve ser educada para assumir o papel de cuidadora, deixando o espaço público e político a cargo dos homens. E é por essa associação da imagem feminina com o lar que muitas mulheres acabaram se afastando do mercado de trabalho e de outras funções que em algum momento desejaram”, explica Sônia.

Mesmo com as conquistas de direitos na história do Brasil, as barreiras e dificuldades são maiores para elas, e aumentam ainda mais quando possuem outros marcadores sociais.

“Sempre ouvimos que a mulher deve ser delicada, feminina e sentimental. Esse estereótipo de gênero é muito prejudicial, pois limita o espaço para ela desenvolver suas aptidões pessoais, manifestar emoções como frustração e descontentamento, ou ainda ter uma postura mais assertiva ou agressiva. Em pleno século XXI, a sociedade ainda impõe sobre mulheres o binarismo carreira versus maternidade. Mulheres podem escolher se dedicar ao que for do seu desejo, mas ela não tem liberdade pra isso. E infelizmente vemos o peso disso todos os dias, quando mulheres escolhem apenas suas carreiras, ou somente a maternidade, por serem impedidas de vivenciarem suas vidas em seus próprios termos”, aponta a especialista em Diversidade e Inclusão.

Profissas: a sua escola da Diversidade

A Profissas se apresenta como Escola da Diversidade. Ela atua com foco no desenvolvimento de habilidades humanas, ou socioemocionais, olhando especialmente para os grupos representativos, além de educar lideranças e demais colaboradores para a inclusão acontecer de verdade. 

Com foco no público feminino, a Profissas busca apoiar a resolução do problema da desigualdade de gênero dentro das organizações por meio do Diversionário Mulheridades, do Programa Lidera Mulheres e do Programa Mulheres Profissas.

O Diversionário Mulheridades é uma experiência de sensibilização e letramento que compartilha conceitos essenciais, contexto histórico, aspectos legais, dados e cenários, desafios e mercado de trabalho que impactam as mulheres no Brasil, considerando os diferentes perfis de mulheres que aqui vivem. É uma oportunidade de iniciar o debate dentro das empresas e propor caminhos e possibilidades para garantir a equidade de gênero nas empresas, com um ambiente seguro e inclusivo.

O Programa Lidera Mulheres tem como foco a formação e o impulsionamento de lideranças femininas. O objetivo é que as participantes saiam poderosas e preparadas para serem excelentes líderes em suas carreiras. Nesta experiência, elas entrarão em contato com mulheres incríveis que conduzirão conteúdos como comunicação, planejamento, saúde emocional, habilidades e performance.

O Programa Mulheres Profissas busca desenvolver habilidades que as ajudarão a alavancar suas carreiras. Para se tornarem profissionais de sucesso, as mulheres passam por uma jornada de conhecimento permeada por autoconhecimento, gestão emocional e financeira, marketing pessoal e muitos outros assuntos. 

“É urgente e necessário derrubar padrões, abrindo caminho para as mulheres viverem como desejam, da maneira que acham melhor, e não da forma como a sociedade impõe como certo. Só assim podemos reduzir as violências que elas sofrem diariamente, dentro e fora das empresas. Para isso, é importante que as pessoas não cheguem a conclusões com base em estereótipos ou crenças que dificultam ou limitam o acesso de mulheres e outras pessoas de grupos representativos aos diversos espaços sociais. E se sua empresa comemora ter alcançado 50% ou mais de mulheres no quadro de colaboradores, saiba que isso não é suficiente. Temos muito o que discutir e construir para que os espaços sociais sejam seguros para mulheres”, conclui Sônia. 

A violência de gênero é um problema sistêmico que precisa ser efetivamente enfrentado, dentro e fora das empresas. É papel da sociedade como um todo, na esfera pública e privada, reconhecer a importância da pauta e cumprir seu papel de pessoa aliada rumo a um país mais equânime, respeitoso e sem violências.

Não deixe de acompanhar nossos conteúdos aqui no blog da Profissas e conhecer mais sobre os nossos programas e ações com foco em Diversidade e Inclusão!

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